terça-feira, 27 de maio de 2014

Batalha política sem trégua na web

Arte / MAX
No exato momento em que o leitor pousar os olhos nessas linhas, milhões de outros estarão, queiram ou não, diante de uma batalha feroz por votos como nunca se viu. Basta entrar na internet. Não haverá depredações, queima de pneus, destruição de prédios públicos, invasão e saque de lojas, nada disso, mas os estragos serão igualmente formidáveis. Talvez até mais graves. É bom então se preparar para a luta, porque ninguém sairá ileso dela. Querem o seu voto e aí vale tudo. Tudo mesmo.

Guerras pelo poder político são assim, sempre foram. Só que eram travadas, nos velhos tempos, sob o fogo cerrado das emoções nos palanques. Ou, mais recentemente, nos minutos insuportáveis do horário eleitoral e nos debates pela TV. Agora não. Travada em redes sociais, a história é bem outra. É guerra pesada.

Alguém é capaz de contabilizar, por exemplo, quantos soldados estão, neste instante, produzindo munição para manter a presidente Dilma Rousseff ocupante do Palácio do Planalto? E quem sabe do que eles são capazes, considerando-se que até hackers de prestígio internacional como Richard Stallman, Marcelo Branco ou Kevin Mitnick estão nesse front? São amigos do ex-presidente Lula e peritos em softwares complicados, como o das urnas eleitorais eletrônicas. Não é preciso muito esforço mental para imaginar o poder dessa artilharia e a força que isso representa contra os inimigos do lado de lá.

Lula até já deixou de lado certos pudores e foi direto a um dos centros de distribuição do chumbo grosso: compareceu, ao lado do ex-ministro da Saúde, Alexandre Padilha, e do prefeito de São Paulo, Fernando Haddad, ao 4º Encontro Nacional de Blogueiros e Ativistas Digitais, no último dia 16 de maio, em São Paulo. O ex-presidente confia na sua cartucheira bloguística. Faz sentido, portanto, que o trio tenha ido lá como se visitasse um bunker pessoal, e não uma reunião de trabalhadores do setor.

Após polêmica, perfil Aécio Boladasso está fora do ar. - Reprodução DC
Sabedores do extraordinário suporte bélico dessa turma, petistas contam também com a capacitação de milhares de replicadores da cartilha, gente bem treinada para entupir o Facebook, o Twiter e toda a malha internética com ataques ao outro lado. De posse de sua inseparável metralhadora verbal, o ex-metalúrgico aproveitou a ocasião para disparar rajadas contra a penúria no sistema de abastecimento de água no Estado e a falta de investimentos no setor –numa referência explícita a um dos flancos por onde as tropas presentes devem avançar. Missão dada, missão cumprida, entende ele.

Some-se a esse pelotão as divisões blindadas estrategicamente posicionadas nas entranhas da máquina administrativa e calcule-se o que virá. E de que forma virá.

A oposição, claro, também arregimenta seus homens. Fontes não confiáveis (porque não há fontes 100% confiáveis em conflitos dessa natureza) apontam que o tucano Aécio Neves armou-se com um contingente de 9 mil especialistas contratados apenas para a briga blogosférica. Se for levado em conta que ele tem, em suas fileiras, correligionários voluntários para o enfrentamento pelas redes, esse número torna-se, então, imensurável. Alinham-se com ele também descontentes de várias plumagens não necessariamente vinculados ao partido, mas às mudanças que anuncia. E isso certamente chega à malha computadorizada com um arsenal muito mais eficiente que qualquer discurso, por mais bombástico que seja.

AVANÇOS E RECUOS

Mas o batalhão também tem que cuidar da proteção de suas bases. Ainda ontem venceu uma batalha judicial contra a Prefeitura de Guarulhos, na região metropolitana de São Paulo, dominada há 14 anos pelo PT. Servidores locais, com o apoio de 27 empresas, vinham utilizando o Facebook e o Twitter para difundir ofensas de vários calibres ao senador, conforme reportagem da Folha de S. Paulo. Uma das páginas criadas para isso foi o Aécio Boladasso, perfil falso que chegou às redes em novembro passado, numa paródia ao Dilma Bolada, perfil aberto pelo estudante Jeferson Monteiro com críticas e afagos à presidente mas que também cospe fogo contra os demais com correntes dela.

A Justiça autorizou a quebra de sigilos dos envolvidos e ficou comprovado que as páginas foram manipuladas nada menos que 81 vezes em 20 dias na Secretaria de Comunicação Social da administração municipal, tudo feito a partir de um IP (identificador do computador usado) ligado a uma agência de propaganda, a PGCom Publicidade.

Dilma Bolada: criador afirma que recebeu proposta do PSDB e PT. - Reprodução DC
Atento ao movimento das tropas, Aécio já havia retirado de cena o @aecioDigital, perfil que mantinha no Twitter. Preocupado com baixas no eleitorado, na semana passada despachou do ar, igualmente, o mineirobrasileiroaecio.com.br. As duas linhas de frente foram traçadas por Xico Graziano, que responde pela área de internet do tucano na campanha, e tinham sido lançadas no mês passado.

Ao que consta, Aécio quer distância do bafafá gerado pelo Dilma Bolada. Há dias, @aeciodigital e @dilmabr trocaram farpas abertamente e o bate-boca teria desagrado o mineiro. Para complicar, Jeferson postou no Facebook, na segunda-feira passada, que tinha sido procurado pelo PSDB para apoiar o tucano em troca de R$ 500 mil. Jeferson, que se encontrou com Dilma em 2013 por conta do sucesso do perfil (tinha cerca de 4.500 seguidores na data da postagem) também teria sido sondado pelos petistas para passar ser ativista pró-Dilma. "É um conteúdo extremamente meu, só eu sei fazer. É ridículo alguém querer comprar, minha personagem não tem preço", diz ele.

Do candidato Eduardo Campos (PSB), pouco se sabe quanto aos seus exércitos virtuais, mas ele se mudou provisoriamente para a capital paulista para estabelecer seu principal QG físico e virtual. Além disso, tem Marina Silva como vice. A proposta dela de instalar a Rede como agremiação política não colou, mas seu poder de fogo é representado por 20 milhões de eleitores, amealhados no último pleito. Quantos posts cada um desses fiéis combatentes pode produzir, marchando ao lado das tropas pernambucanas de Campos? Ganha uma bala perdida quem souber.

Como não há registro na História da presença de freiras em prostíbulos, principalmente nos partidários, cabe de tudo na detonação do adversário. Menos civilidade, respeito ou decência. Qualquer um que tenha um smartphone sabe disso, pelo simples fato de que não lhe resta outra escolha senão acompanhar os embates. O compartilhamento dos excessos chegou a tal ponto que até a Copa passou a ter uma cara de torneio regional e um conteúdo mais voltado para o que ela trará, de bom ou ruim, para as trincheiras. Uma espécie de paiol a ser conquistado. Mal comparando, a pátria de chuteiras entra em um campo minado.

Haja Copa ou não, prevê-se em torno de suas circunstâncias a mais sangrenta peleja em busca do eleito. Por suas inviabilidades estruturais, pela indignação popular com tantos gastos públicos, pela insistência governamental em erguer arenas colossais sem sustentabilidade econômica futura, pelos incansáveis blackblocs, por qualquer coisa. Até mesmo pelo eventual sucesso nacional como anfitrião do Mundial. Não importa. Não haverá armistício na web.

Por Luca Verdi
Fonte: Diário do Comércio - SP

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